Sobre a "corrente das barrigas" que anda rolando no Facebook, essa em que mulheres desafiam mulheres a postarem fotos do período em que estiveram grávidas numa campanha contra o aborto... preciso falar. Preciso.
Tenho visto gente que amo nessa "campanha", compreendo suas intenções, tento respeitar seu ponto de vista. Acredito que elas não aprovem a morte de um milhão de brasileiras todos os anos em virtude de abortos clandestinos inseguros e pensam estar defendendo a vida.
No entanto, essa campanha me enoja em tantos níveis e por tantos motivos que tenho até dificuldade de organizar o pensamento.
Vejamos:
Quando se usa como argumento contra o aborto a visualização da própria experiência em relação à maternidade o que se faz é enxergar o mundo a partir do próprio umbigo. É de uma pequenez deprimente. Sua gravidez pode ter sido linda, desejada, amparada, saudável e estruturada. Ótimo. Ainda que não tenha sido exatamente assim você, cá entre nós, não vai admitir nem para o espelho as coisas em que pensou antes do pai do seu anjo assumir a paternidade, ou quando se deu conta que seu sonho de faculdade e independência tinham sido adiados. Agora tudo está bem. Ok. Mas seria bacana se você conseguisse entender que a SUA experiência é a SUA experiência. O que você sentiu e sente em relação à maternidade é assunto seu. Há mulheres sem nenhuma condição física, econômica e psicológica para dar à luz um bebê. A grande maioria o fará assim mesmo. Mesmo não querendo ser mãe, não desejando esse filho, mesmo sabendo que não tem grana pra dar a ele a vida que ela acha decente. Quem serão esses filhos? Bom isso já não é problema de ninguém além de mãe e filho, correto? Se essa mãe for descontar no filho, se ele for negligenciado, se sentir desamor e solidão que se vire.
Talvez você tenha sido uma daquelas heroínas. Talvez você tenha "vencido" a maternidade e realizado todos os teus sonhos, talvez tenha criado cinco filhos sozinha. Ainda assim essa é você. VOCÊ, entende? É uma covardia cobrar heroismo de quem quer que seja. Dedicar a vida de forma sacrificante a algo ou alguém deve ser uma escolha pessoal.
Você que faz campanha contra aborto, o que pensa do recorrente e legal aborto masculino? Você acha que homens que se recusam a assumir a paternidade devem ser presos? Se você disser que sim, vou dizer que é mentira. Você não assinou nenhuma petição online, nem criou ou participou de evento no Facebook pra isso, tenho certeza.
Homens declaram publicamente que não estão prontos, que não tem condições financeiras e que tem outros planos frente a uma gravidez indesejada. E pronto. Assumem apenas via decisão judicial três anos depois do nascimento e submetem seu filho ao abandono econômico e afetivo. E tudo bem. Por algumas mulheres ele será chamado irresponsável ou covarde. A maioria dos homens dirá "quem nunca?" Mas essa não é uma conduta criminosa, nem na sua cabeça nem na de ninguém.
Ninguém pede pra que você aprove o aborto (que é uma intervenção que precisa de instrumentos cirúrgicos e não da sua bênção), ninguém pede que você aborte ou ensine suas filhas a abortar, você não precisa gostar de nada. Apenas respeite, aponte seu dedo pra uma estrela ao invés de aponta-lo pra quem já está imersa em dor e desamparo. E por favor, não use sua suposta felicidade materna sem precedentes como argumento para defender que essas mulheres continuem morrendo ou vivendo escravizadas, elas e seus filhos indesejados, pela maternidade. Ninguém merece isso.
Por último, eu sei que vocês podem entender o que eu vou dizer agora, e vou dizer respirando fundo e enchendo meu coração de amor: vocês são mulheres. Vocês são mulheres. Nós todas somos mulheres. A gente sabe, só a gente sabe o que isso significa. Olhe bem no espelho, pense nas mulheres que você ama, em todas as semelhanças entre vocês, pense nas distâncias também. Pense no quanto esse mundo é grande e em quantas mulheres há nele, em como vivem vidas tão diferetes entre si. Não repita coisas cruéis como: "fazer foi bom, né?" ou "como é que alguém engravida sem querer hoje em dia?". Você sabe a verdade, eu sei, nós todas sabemos.
Amo você, irmã. É o que somos, irmãs.
Tenho visto gente que amo nessa "campanha", compreendo suas intenções, tento respeitar seu ponto de vista. Acredito que elas não aprovem a morte de um milhão de brasileiras todos os anos em virtude de abortos clandestinos inseguros e pensam estar defendendo a vida.
No entanto, essa campanha me enoja em tantos níveis e por tantos motivos que tenho até dificuldade de organizar o pensamento.
Vejamos:
Quando se usa como argumento contra o aborto a visualização da própria experiência em relação à maternidade o que se faz é enxergar o mundo a partir do próprio umbigo. É de uma pequenez deprimente. Sua gravidez pode ter sido linda, desejada, amparada, saudável e estruturada. Ótimo. Ainda que não tenha sido exatamente assim você, cá entre nós, não vai admitir nem para o espelho as coisas em que pensou antes do pai do seu anjo assumir a paternidade, ou quando se deu conta que seu sonho de faculdade e independência tinham sido adiados. Agora tudo está bem. Ok. Mas seria bacana se você conseguisse entender que a SUA experiência é a SUA experiência. O que você sentiu e sente em relação à maternidade é assunto seu. Há mulheres sem nenhuma condição física, econômica e psicológica para dar à luz um bebê. A grande maioria o fará assim mesmo. Mesmo não querendo ser mãe, não desejando esse filho, mesmo sabendo que não tem grana pra dar a ele a vida que ela acha decente. Quem serão esses filhos? Bom isso já não é problema de ninguém além de mãe e filho, correto? Se essa mãe for descontar no filho, se ele for negligenciado, se sentir desamor e solidão que se vire.
Talvez você tenha sido uma daquelas heroínas. Talvez você tenha "vencido" a maternidade e realizado todos os teus sonhos, talvez tenha criado cinco filhos sozinha. Ainda assim essa é você. VOCÊ, entende? É uma covardia cobrar heroismo de quem quer que seja. Dedicar a vida de forma sacrificante a algo ou alguém deve ser uma escolha pessoal.
Você que faz campanha contra aborto, o que pensa do recorrente e legal aborto masculino? Você acha que homens que se recusam a assumir a paternidade devem ser presos? Se você disser que sim, vou dizer que é mentira. Você não assinou nenhuma petição online, nem criou ou participou de evento no Facebook pra isso, tenho certeza.
Homens declaram publicamente que não estão prontos, que não tem condições financeiras e que tem outros planos frente a uma gravidez indesejada. E pronto. Assumem apenas via decisão judicial três anos depois do nascimento e submetem seu filho ao abandono econômico e afetivo. E tudo bem. Por algumas mulheres ele será chamado irresponsável ou covarde. A maioria dos homens dirá "quem nunca?" Mas essa não é uma conduta criminosa, nem na sua cabeça nem na de ninguém.
Ninguém pede pra que você aprove o aborto (que é uma intervenção que precisa de instrumentos cirúrgicos e não da sua bênção), ninguém pede que você aborte ou ensine suas filhas a abortar, você não precisa gostar de nada. Apenas respeite, aponte seu dedo pra uma estrela ao invés de aponta-lo pra quem já está imersa em dor e desamparo. E por favor, não use sua suposta felicidade materna sem precedentes como argumento para defender que essas mulheres continuem morrendo ou vivendo escravizadas, elas e seus filhos indesejados, pela maternidade. Ninguém merece isso.
Por último, eu sei que vocês podem entender o que eu vou dizer agora, e vou dizer respirando fundo e enchendo meu coração de amor: vocês são mulheres. Vocês são mulheres. Nós todas somos mulheres. A gente sabe, só a gente sabe o que isso significa. Olhe bem no espelho, pense nas mulheres que você ama, em todas as semelhanças entre vocês, pense nas distâncias também. Pense no quanto esse mundo é grande e em quantas mulheres há nele, em como vivem vidas tão diferetes entre si. Não repita coisas cruéis como: "fazer foi bom, né?" ou "como é que alguém engravida sem querer hoje em dia?". Você sabe a verdade, eu sei, nós todas sabemos.
Amo você, irmã. É o que somos, irmãs.